Por: Rubens Nascimento
O direito de propriedade sofre restrições ao seu exercício, impostas pelo interesse coletivo e pelo interesse individual. As relações de vizinhança restringem o exercício da posse pelo interesse individual.
Os direitos reais de vizinhança constituem-se em direitos e deveres entre os confinantes. Interferências prejudiciais à segurança, à saúde e ao sossego podem ocorrer resultando em conflitos de vizinhança classificados em ilegais, abusivos e lesivos.
Os atos ilegais resultam em um dano concreto ao vizinho. Por exemplo, atear fogo no prédio do vizinho. É garantido ao agente lesado o direito de indenização. Os atos abusivos são cometidos mesmo estando dentro dos limites da sua propriedade, havendo prejuízo para o vizinho devido ao barulho excessivo.
Os atos lesivos causam dano ao vizinho mesmo que o agente esteja fazendo uso normal de sua propriedade e a atividade autorizada pelo poder público. É o exemplo da indústria cuja fuligem polui o ambiente.
Os atos ilegais e abusivos estão abrangidos no art. 1277 do Código Civil. Previsto no referido artigo, os atos em que a propriedade é utilizada de modo anormal. O dispositivo confere ao proprietário ou possuidor de direito fazer cessar as interferências ilegais ou abusivas provocadas pela propriedade vizinha.
Segundo o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves, a vida em sociedade impõe às pessoas a obrigação de suportar certos incômodos, desde que não ultrapassem os limites do razoável e do tolerável.
Hely Lopes Meirelles complementa o entendimento explicando que a lei confere ao vizinho o poder de impedir que os outros o incomodem em excesso, por meio de ruídos intoleráveis, que perturbem o sossego natural do lar, do
escritório, da escola, do hospital, na medida da quietude exigível para cada um destes ambientes.
Para a solução dos conflitos de vizinhança deve se verificar a extensão do dano causado. Se o incômodo é normal, tolerável, não deve ser reprimido. No entanto, se o dano for intolerável o juiz deve primeiramente determinar que seja reduzido a proporções normais fixando horários de funcionamento da atividade considerada nociva.
Entretanto, se não for possível reduzir o incômodo a níveis suportáveis, o juiz pode determinar a cessação da atividade. Isso ocorre quando as medidas adequadas não conseguiram reduzir o incômodo ou a ordem judicial não foi cumprida. O juiz determinará o fechamento da indústria, a cessação da atividade ou demolição da obra, se forem de interesse particular.
A situação muda se o interesse da atividade for público. Diante de tal situação se o incômodo não puder ser reduzido, será imposta ao causador do dano a obrigação de indenizar o vizinho. Há um conflito de interesses: o interesse de caráter privado como o de cunho público, ambos merecem proteção. Porém o interesse público prevalece sobre o particular.
O art. 1285 do CC trata da hipótese da passagem forçada que atende ao interesse social. O direito de passagem só existe quando o encravamento é natural e absoluto. Não se considera encravado o imóvel quando existe outra saída, ainda que difícil e penosa. Razões de comodidade não podem ser atendidas para obrigar o vizinho a suportar a passagem por seu imóvel.
Extingue-se a passagem forçada no exemplo de abertura de estrada pública que atravessa ou passa do lado de suas divisas, ou quando é anexado a outro que tem acesso à via pública.
Disposto no art. 1286 do aludido diploma que mediante recebimento de indenização, o proprietário é obrigado a tolerar a passagem através de seu imóvel, de cabos, tubulações e de outros condutos subterrâneos de utilidade pública em proveito de proprietários vizinhos, quando de outro modo for impossível ou excessivamente onerosa.
É concebido pela lei ao proprietário o direito de cercar, murar, valar ou tapar qualquer modo o seu prédio, quer seja urbano ou rural. O proprietário tem a faculdade de dispor do que pertence como quiser. O direito de construir emana do direito de propriedade, entretanto, este direito encontra limitações impostas pelos regulamentos administrativos. Há um impedimento da construção de prédios de grande porte e fábricas em bairros residenciais.
Provado o dano e a relação de causalidade entre o dano e a construção vizinha é obtida a indenização, sendo desnecessária a demonstração de culpa do agente, pois a responsabilidade pelos danos causados a vizinhos em virtude de construção é objetiva.
É proibido abrir janelas, terraço ou varanda, a menos de um metro e meio do terreno vizinho, como dispõe o art. 1301 do Código Civil. Essa medida tem o propósito de impedir que haja perturbação da privacidade familiar. Contudo, pode haver abertura para luz ou ventilação não maiores de dez centímetros de largura sobre vinte de comprimento e construídas a mais de dois metros de altura de cada piso. A finalidade dessa exigência é preservar a intimidade das famílias, resguardando-os da indiscrição dos vizinhos.
Segundo o art. 1313 do Código Civil, o proprietário ou ocupante do imóvel é obrigado a tolerar que o vizinho entre no prédio mediante aviso prévio para dele usar, quando indispensável à restauração, construção, reconstrução ou limpeza de sua casa ou do muro divisório. Apoderar de coisas suas, inclusive animais que aí se encontrem casualmente. Se do exercício do direito provier dano, terá o prejudicado direito ao ressarcimento.
Uma convivência harmônica consiste no respeito mútuo ao outro, respeitando sua alteridade, seu direito à dignidade. De ter sua privacidade, segurança, entre outros. As normas delimitam a conduta humana estabelecendo até onde podemos ir.
Muitos conflitos são gerados pela falta de consciência de coisas simples como evitar a emissão de efeitos sonoros após um determinado horário perturbando dessa forma o descanso dos vizinhos, entre outros. As relações de vizinhança sejam elas urbanas ou rurais encontram divergência de interesses ou a tentativa de o interesse de um prevalecer sobre os demais. Necessária cautela de qual direito deve prevalecer, sendo que se for conflito entre um direito privado e um público, sempre o interesse social deve prevalecer.
REFERÊNCIAS:
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Volume 5, Direito das Coisas-8ª ed. –São Paulo:Saraiva,2013.
LEI 10.406/2002. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em 22 de junho de 2016.
AVISO: O conteúdo de cada comentário é de única e exclusiva responsabilidade do autor da mensagem.