A Coragem de ter medo

Marcos Cordeiro de Andrade

Curitiba (PR), 25 de abril de 2020.

Caros colegas.

Estou com medo. Medo de ser atingido pela força letal desse vírus maluco que passeia pelo mundo com função devastadora. Matar com objetivo inteligente parece ser parte da sua missão. Matar com viés de seleção estabilizadora ceifando vidas no final da existência, num parâmetro macabro de eliminação em massa. Parece até que ele prima em atingir a todos com estratégia de guerras, posto que dá aos jovens oportunidades de superação, para que se tornem mais fortes e duráveis – o que nega aos idosos como se o propósito se prenda à diminuição populacional, renovando o plantel para redução dos fatores que geram conflitos irreconciliáveis, pela disputa de espaços preferenciais para continuidade da existência. Como resultante do seu poder destrutivo, pode pôr fim a guerras, reordenar a fome, incutir sentimentos nobres sobrepondo-se aos comportamentos condenáveis, reinventando o amor ao próximo através da solidariedade como bem comum.

Procura-se o inventor dessa doença, como desculpa para justificar conformismos e outras posturas condenáveis. Nisso invoca-se tanto a Deus quanto ao Diabo como responsáveis pelo balanço resultante cuja velocidade para alcançá-lo deixa o mundo em polvorosa.

Mal comparando, os noticiários nos mostram estatísticas como diante de números olímpicos, onde recordes são batidos constantemente numa disputa em que as nações envolvidas não queriam estar presentes.

Especula-se que estamos revivendo um de determinados momentos em que a humanidade se viu no passado, diante de fenômenos advindos aleatoriamente para pôr “ordem na casa”. Seja para combater a fome ou gerenciar conflitos, as coisas se sucedem na forma de cataclismos temporais ou surgimento de doenças sem cura – como agora.

Por isso tenho medo.

Medo de ser um dos escolhidos pela voracidade desse vírus assassino. E este medo me leva a um viver anormal, enclausurado, modificando hábitos e cultivando solidão forçada. Mas bem sei que isso somente não basta parame tornar imune. Qualquer dia desses terei abaixado a guarda e o matador invisível adentrará meus domínios. E assim, se for a vontade de Deus, serei mais um condenado pelas mãos do Corona vírus, que terá descoberto que sou um dos preferidos para constar nos Banquetes da Morte servidos diariamente nos hospitais do mundo: cardiopata, diabético, hipertenso, e, como iguaria sublime, o fato de que tenho 81 anos de idade – provavelmente sem serventia no futuro em construção pela pandemia presente.

Mesmo assim, enquanto as autoridades sanitárias e os governantes do mundo batem cabeças nessa briga no escuro, devemos seguir as sensatas orientações que nos direcionam. Ficar em casa é a melhor delas.

Quem sabe se enclausurados demonstraremos ao vírus criminoso que ainda não estamos prontos para submissão à sua sanha – e ele nos deixe em paz para servir ao próximo com a sabedoria e experiência dos ressuscitados.

Marcos Cordeiro de Andrade

81 anos

www.previplano1.com.br

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